Uma jovem de Feira de Santana decidiu “invadir” o universo masculino e transformou navalhas, cremes de barbear e toalhas quentes em seus instrumentos de trabalho, no chamados Barber choper (antigas barbearias), com o bônus de cervejas, jogos, e toda uma atmosfera convidativa, que faz com que clientes estejam lá para além dos serviços de barba, cabelo e bigode.
Karen Karla Ferreira, 29 anos, grávida de 9 meses de uma menina, conta que iniciou a carreira como barbeira, por influência do marido, que já era barbeiro.
“Eu cresci trabalhando com vendas, depois fui trabalhar na parte administrativa de indústria e meu esposo sempre me dizia que a destreza que eu tinha na parte administrativa, era para dedicar a barbearia, dizia para trabalharmos juntos que ele me ensinaria o ofício. Falava isso sempre que tinha oportunidade, mas eu nunca me vi nessa área, nunca tinha tido contato com barbearia a não ser quando escutava meu pai e irmão dizer que iam cortar o cabelo. Depois de um tempo eu decidi dizer sim para ele, pois estava cansada psicologicamente no antigo trabalho. Nisto meu marido agarrou a oportunidade e me ensinou, deu muito trabalho para aprender, mas todos os dias ele repetia as mesmas coisas com muita paciência, até o dia que a minha ficha caiu e comecei a trabalhar de fato com ele na barbearia”, conta.
A profissional conta como enfrentou a resistência do público que estranharam que uma mulher fosse fazer o serviço majoritariamente desempenhado por homens.
“No início os clientes achavam engraçado e diziam que nunca cortariam o cabelo comigo porque eles me viam antes servindo água e na recepção, quando eu ainda estava fazendo curso. Eu cheguei ‘na manha’ conquistando a confiança. Me oferecia para lavar o cabelo deles após o corte, hidratava e passava pomada direitinho, desse jeito mostrava que não tinha mão pesada. Depois quando tinha alisamento e os barbeiros estavam ocupados eu me oferecia para fazer essa parte e toda oportunidade que via eu agarrava até chegar o dia que eu tive oportunidade de fazer um pé de cabelo do cliente e passei a atender de vez na barbearia”, esclarece.
Karla que alçou “voos” diferentes do marido, principal incentivador, agora está ansiosa por voltar a trabalhar junto com o seu mentor.
“Quando chegou a pandemia acabamos trabalhando em espaços diferentes para conseguir uma renda melhor, mas graças a Deus estamos voltando a trabalhar juntos, pois na próxima semana estaremos inaugurando um novo espaço, uma nova barbearia, onde trabalharemos juntos novamente. As expectativas estão altas, os clientes estão felizes e empolgados nessa nova fase. Daqui a pouco terei mais uma bebezinha, minha filha Zoe. Estou trabalhando ainda porque é o que eu gosto de fazer, Ele me ensinou a fazer com amor. Com todo trabalho nem tenho tempo para dedicar às redes sociais, mas é uma coisa que eu gostaria de fazer mais. Só tem uma coisa que me arrependo, de não ter começado antes”.
A jovem diz que sempre acontece do cliente, no primeiro momento, ficar impactado por ser uma mulher que vai cortar o cabelo e diz que conquista o mercado com muita técnica e dedicação.
“Mas, estudo bastante e quando eles olham todos os certificados na minha parede, passam a confiar e acabam indicando para outras pessoas. Na verdade, procuro todos os dias ser melhor, quando atendo um cliente, quando ele vai saindo vou observando o corte que fiz procuro me aprimorar a cada corte para ser cada vez mais uma grande profissional. Meu objetivo é estudar cada vez mais para quando as pessoas virem meu trabalho, saberem que essa mulher, ‘bota para lá’, tem que respeitar, quando virem minhas obras primas, cabelo/barba, se admirarem”, argumenta.
Representatividade
A empreendedora abriu espaço para outras mulheres e conta que parte do mercado não só já aceitou a presença delas, como também passou a preferir um atendimento feminino. Através de mim, outras mulheres começaram a fazer o curso, porque meu esposo dá aulas de barbeiro e outras mulheres acabaram sendo influenciadas a também fazerem o curso. Além disso, muitas esposas de barbeiros passam a ter um papel mais ativo no local, algumas que inclusive nem se sentiam a vontade de frequentar o ambiente, passaram a ir. Muitos homens também passaram a preferir atendimento feminino por achar que mulheres são mais detalhistas. Acredito que esse seja meu propósito, quando estou cortando o cabelo de um cliente eu lembro que ele é um filho de Deus e que Deus vai se alegrar se eu fizer o meu melhor”.
Reportagem: Reginaldo Júnior / Portal MF